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21 dezembro 2008

Reflexão para o Natal

Singelos propósitos

Neste Natal, guardarei em caixas bem fechadas o que me transmuta naquele que não sou: a inveja, o ciúme, a sede de vingança, e todos os ressentimentos que me corroem as vísceras. Lacradas as caixas, atirarei todas nas profundezas do mar do olvido.

Neste Natal, esvaziarei o escaninho de minhas torpes intenções; as gavetas de tantas vãs ilusões; os armários de compulsivas ambições. Com os pés descalços, trilharei a senda saudável de uma existência modesta, sempre solidária. E manterei vedada a chaminé à entrada consumista de Papai Noel.

Armarei uma árvore de Natal cujo tronco será da mesma madeira que os princípios que me norteiam os passos; os galhos, as sedutoras vias às quais ousei dizer não; as flores, a paz colhida ao enclausurar-me no silêncio interior; os frutos, essa esperança-lagarta que insiste em transformar-se em utopia, sobrevoando o pessimismo que me assalta.

Neste Natal, não celebrarei liturgias solenes em dissonância com a glória cantada pelos anjos do presépio; não me fartarei em ceias enquanto o Menino se abriga ao relento num cocho; nem darei presentes embalados em falsos sentimentos.

Neste Natal, colherei as lágrimas dos desesperados para regar meu jardim de girassóis. Rogo a Deus ressuscitar a criança escondida em algum recanto de minha memória, a que um dia fui, menino que sabia confiar e era capaz de imprimir fantasias coloridas ao lado obscuro da vida.

Quero um Natal de brindes à alegria de viver, hinos à gratidão da fé e à magia da amizade. Natal cujo presépio seja o meu próprio coração, no qual o Menino Jesus faça desabrochar todo o amor que se oculta nos sombrios porões do meu ego.


Frei Betto. Autor de “A Arte de Semear Estrelas”.


O DIA, Rio de Janeiro, 21 dez. 2008.

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