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01 julho 2015

EPF 2015 - Alegria do Evangelho

25. Não ignoro que hoje os documentos não suscitam o mesmo interesse que noutras épocas, acabando rapidamente esquecidos. Apesar disso sublinho que, aquilo que pretendo deixar expresso aqui, possui um significado programático e tem consequências importantes. Espero que todas as comunidades se esforcem por actuar os meios necessários para avançar no caminho duma conversão pastoral e missionária, que não pode deixar as coisas como estão. Neste momento, não nos serve uma «simples administração».[21] Constituamo-nos em «estado permanente de missão»,[22] em todas as regiões da terra.

26. Paulo VI convidou a alargar o apelo à renovação de modo que ressalte, com força, que não se dirige apenas aos indivíduos, mas à Igreja inteira. Lembremos este texto memorável, que não perdeu a sua força interpeladora: «A Igreja deve aprofundar a consciência de si mesma, meditar sobre o seu próprio mistério (...). Desta consciência esclarecida e operante deriva espontaneamente um desejo de comparar a imagem ideal da Igreja, tal como Cristo a viu, quis e amou, ou seja, como sua Esposa santa e imaculada (Ef 5, 27), com o rosto real que a Igreja apresenta hoje. (…) Em consequência disso, surge uma necessidade generosa e quase impaciente de renovação, isto é, de emenda dos defeitos, que aquela consciência denuncia e rejeita, como se fosse um exame interior ao espelho do modelo que Cristo nos deixou de Si mesmo».[23]
O Concílio Vaticano II apresentou a conversão eclesial como a abertura a uma reforma permanente de si mesma por fidelidade a Jesus Cristo: «Toda a renovação da Igreja consiste essencialmente numa maior fidelidade à própria vocação. (…) A Igreja peregrina é chamada por Cristo a esta reforma perene. Como instituição humana e terrena, a Igreja necessita perpetuamente desta reforma».[24]
Há estruturas eclesiais que podem chegar a condicionar um dinamismo evangelizador; de igual modo, as boas estruturas servem quando há uma vida que as anima, sustenta e avalia. Sem vida nova e espírito evangélico autêntico, sem «fidelidade da Igreja à própria vocação», toda e qualquer nova estrutura se corrompe em pouco tempo.


27. Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo actual que à auto-preservação. A reforma das estruturas, que a conversão pastoral exige, só se pode entender neste sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude constante de «saída» e, assim, favoreça a resposta positiva de todos aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade. Como dizia João Paulo II aos Bispos da Oceânia, «toda a renovação na Igreja há-de ter como alvo a missão, para não cair vítima duma espécie de introversão eclesial».[25]

28. A paróquia não é uma estrutura caduca; precisamente porque possui uma grande plasticidade, pode assumir formas muito diferentes que requerem a docilidade e a criatividade missionária do Pastor e da comunidade. Embora não seja certamente a única instituição evangelizadora, se for capaz de se reformar e adaptar constantemente, continuará a ser «a própria Igreja que vive no meio das casas dos seus filhos e das suas filhas».[26] Isto supõe que esteja realmente em contacto com as famílias e com a vida do povo, e não se torne uma estrutura complicada, separada das pessoas, nem um grupo de eleitos que olham para si mesmos. A paróquia é presença eclesial no território, âmbito para a escuta da Palavra, o crescimento da vida cristã, o diálogo, o anúncio, a caridade generosa, a adoração e a celebração.[27] Através de todas as suas actividades, a paróquia incentiva e forma os seus membros para serem agentes da evangelização.[28] É comunidade de comunidades, santuário onde os sedentos vão beber para continuarem a caminhar, e centro de constante envio missionário. Temos, porém, de reconhecer que o apelo à revisão e renovação das paróquias ainda não deu suficientemente fruto, tornando-as ainda mais próximas das pessoas, sendo âmbitos de viva comunhão e participação e orientando-as completamente para a missão.

29. As outras instituições eclesiais, comunidades de base e pequenas comunidades, movimentos e outras formas de associação são uma riqueza da Igreja que o Espírito suscita para evangelizar todos os ambientes e sectores. Frequentemente trazem um novo ardor evangelizador e uma capacidade de diálogo com o mundo que renovam a Igreja. Mas é muito salutar que não percam o contacto com esta realidade muito rica da paróquia local e que se integrem de bom grado na pastoral orgânica da Igreja particular.[29] Esta integração evitará que fiquem só com uma parte do Evangelho e da Igreja, ou que se transformem em nómades sem raízes.

30. Cada Igreja particular, porção da Igreja Católica sob a guia do seu Bispo, está, também ela, chamada à conversão missionária. Ela é o sujeito primário da evangelização,[30] enquanto é a manifestação concreta da única Igreja num lugar da terra e, nela, «está verdadeiramente presente e opera a Igreja de Cristo, una, santa, católica e apostólica».[31] É a Igreja encarnada num espaço concreto, dotada de todos os meios de salvação dados por Cristo, mas com um rosto local. A sua alegria de comunicar Jesus Cristo exprime-se tanto na sua preocupação por anunciá-Lo noutros lugares mais necessitados, como numa constante saída para as periferias do seu território ou para os novos âmbitos socioculturais.[32] Procura estar sempre onde fazem mais falta a luz e a vida do Ressuscitado.[33] Para que este impulso missionário seja cada  vez mais intenso, generoso e fecundo, exorto também cada uma das Igrejas particulares a entrar decididamente num processo de discernimento, purificação e reforma.

31. O Bispo deve favorecer sempre a comunhão missionária na sua Igreja diocesana, seguindo o ideal das primeiras comunidades cristãs, em que os crentes tinham um só coração e uma só alma (cf. Act 4, 32) . Para isso, às vezes pôr-se-á à frente para indicar a estrada e sustentar a esperança do povo, outras vezes manter-se-á simplesmente no meio de todos com a sua proximidade simples e misericordiosa e, em certas circunstâncias, deverá caminhar atrás do povo, para ajudar aqueles que se atrasaram e sobretudo porque o próprio rebanho possui o olfacto para encontrar novas estradas. Na sua missão de promover uma comunhão dinâmica, aberta e missionária, deverá estimular e procurar o amadurecimento dos organismos de participação propostos peloCódigo de Direito Canónico [34] e de outras formas de diálogo pastoral, com o desejo de ouvir a todos, e não apenas alguns sempre prontos a lisonjeá-lo. Mas o objectivo destes processos participativos não há-de ser principalmente a organização eclesial, mas o sonho missionário de chegar a todos.

32. Dado que sou chamado a viver aquilo que peço aos outros, devo pensar também numa conversão do papado. Compete-me, como Bispo de Roma, permanecer aberto às sugestões tendentes a um exercício do meu ministério que o torne mais fiel ao significado que Jesus Cristo pretendeu dar-lhe e às necessidades actuais da evangelização. O Papa João Paulo II pediu que o ajudassem a encontrar «uma forma de exercício do primado que, sem renunciar de modo algum ao que é essencial da sua missão, se abra a uma situação nova».[35] Pouco temos avançado neste sentido. Também o papado e as estruturas centrais da Igreja universal precisam de ouvir este apelo a uma conversão pastoral. O Concílio Vaticano II afirmou que, à semelhança das antigas Igrejas patriarcais, as conferências episcopais podem «aportar uma contribuição múltipla e fecunda, para que o sentimento colegial leve a aplicações concretas».[36] Mas este desejo não se realizou plenamente, porque ainda não foi suficientemente explicitado um estatuto das conferências episcopais que as considere como sujeitos de atribuições concretas, incluindo alguma autêntica autoridade doutrinal.[37] Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e a sua dinâmica missionária.

33. A pastoral em chave missionária exige o abandono deste cómodo critério pastoral: «fez-se sempre assim». Convido todos a serem ousados e criativos nesta tarefa de repensar os objectivos, as estruturas, o estilo e os métodos evangelizadores das respectivas comunidades. Uma identificação dos fins, sem uma condigna busca comunitária dos meios para os alcançar, está condenada a traduzir-se em mera fantasia. A todos exorto a aplicarem, com generosidade e coragem, as orientações deste documento, sem impedimentos nem receios. Importante é não caminhar sozinho, mas ter sempre em conta os irmãos e, de modo especial, a guia dos Bispos, num discernimento pastoral sábio e realista.

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